123





                                                                                           quem será?


Pós-publicação:
Devia morrer-se de outra maneira. Transformarmo-nos em fumo, por exemplo. Ou em nuvens. Quando nos sentíssemos cansados, fartos do mesmo sol a fingir de novo todas as manhãs, convocaríamos os amigos mais íntimos com um cartão de convite para o ritual do Grande Desfazer: "Fulano de tal comunica a V. Exa. que vai transformar-se em nuvem hoje às 9 horas. Traje de passeio". E então, solenemente, com passos de reter tempo, fatos escuros, olhos de lua de cerimônia, viríamos todos assistir à despedida. Apertos de mãos quentes. Ternura de calafrio. "Adeus! Adeus!" E, pouco a pouco, devagarinho, sem sofrimento, numa lassidão de arrancar raízes...(primeiro, os olhos... em seguida, os lábios... depois os cabelos... ) a carne, em vez de apodrecer, começaria a transfigurar-se em fumo... tão leve... tão sutil... tão pòlen...como aquela nuvem além (vêem?) — nesta tarde de outono ainda tocada por um vento de lábios azuis...
                                                                                                                               José Gomes Ferreira
Texto colocado na caixa de comentários por Rose

4 comentários:

  1. Anónimo30.9.10

    Serei por estes dias que nascem
    Pó da terra ao vento
    Um pouco de nada
    Um gostoso lamento
    Serei por estas tardes que caem
    Ouro sobre azul, relento vivo
    Mistério do escuro
    Folha de Outono
    Amarelo cativo
    Serei por estas manhãs de alvorada
    O romper da luz
    E o terno entardecer
    Da madrugada

    Autor ?

    (Bye Rose)

    ResponderEliminar
  2. Anónimo30.9.10

    Devia morrer-se de outra maneira.
    Transformarmo-nos em fumo, por exemplo.
    Ou em nuvens.
    Quando nos sentíssemos cansados, fartos do mesmo sol
    a fingir de novo todas as manhãs, convocaríamos
    os amigos mais íntimos com um cartão de convite
    para o ritual do Grande Desfazer: "Fulano de tal comunica
    a V. Exa. que vai transformar-se em nuvem hoje
    às 9 horas. Traje de passeio".
    E então, solenemente, com passos de reter tempo, fatos
    escuros, olhos de lua de cerimônia, viríamos todos assistir
    a despedida.
    Apertos de mãos quentes. Ternura de calafrio.
    "Adeus! Adeus!"
    E, pouco a pouco, devagarinho, sem sofrimento,
    numa lassidão de arrancar raízes...
    (primeiro, os olhos... em seguida, os lábios... depois os cabelos... )
    a carne, em vez de apodrecer, começaria a transfigurar-se
    em fumo... tão leve... tão sutil... tão pòlen...
    como aquela nuvem além (vêem?) — nesta tarde de outono
    ainda tocada por um vento de lábios azuis...
    (José Gomes Ferreira)

    (Bye-bye Rose)

    ResponderEliminar
  3. Invoquemos o(s) Deus(es) para lhes rogar que a morte corporal passe a ser assim, pois a da alma, a acontecer, deve ser parecida com o desejo do Gomes Ferreira. Talvez ouçam as nossas preces. E se as satisfizerem, quando morrer quero transformar-me na nuvem mais bela, para merecer ser fotografado, eu, morto-nuvem a pairar no céu à luz do crepúsculo. Mas, para isso, concerteza não posso ter pecados.


    Obrigado pelo texto. É belo.

    ResponderEliminar
  4. Anónimo17.3.12

    Bela fotografia, com umas cores encantadoras e uma descrição que encaixa perfeitamente! Gostei!

    ResponderEliminar